2022-06-12

ṚTADHVANĪ: A SÍNTESE DO ŚRADDHĀ YOGA SVATANTRA



Dinacaryā
(pronúncia aproximada: di-na-tcha-ryá)

A disciplina sintrópica (caryā) diária (dina) do Śraddhā Yoga consiste em responder ao chamado do universo a partir do foco absoluto no coração — fonte de śraddhā, energia espiritual que traz clareza interior, bom senso e lucidez amorosa à ação. Do coração irradia a luz da śraddhā; na mente clarificada, ela se torna eixo de consciência e ética.

Essa resposta não acontece em um tempo amorfo, mas pulsa na arquitetura viva dos seis períodos sagrados do dia (Ṣaḍ-kāla). Cada amanhecer, meio-dia, entardecer e noite carrega uma qualidade própria da śakti do Tempo, convidando o praticante a viver a disciplina não como lista de tarefas, mas como participação consciente na mandala temporal do universo. A dinacaryā é, assim, o modo humano de caminhar dentro do Ṣaḍ-kāla: ajustar a respiração, a intenção e o gesto à respiração maior de Brahman.

No silêncio do amanhecer, com os olhos suavemente fechados, voltamos a atenção ao Ājñā Chakra — sede do foco impecável — onde Iḍā e Piṅgala convergem e a dualidade se recolhe. Ali meditamos no Ātman como puro Espírito, e em sua pulsação viva, Brahma-Śakti, o dinamismo interior do Ser. Essa vibração é reconhecida na tradição como Śraddhā — poder amoroso de Śrī Yoga Devī, aspecto do sagrado feminino que guia a inteligência do coração.

O início e o selo da Dinacaryā – disciplina que reacende em nós o fluxo de Ṛta, a ordem viva do cosmos, ao longo dos seis tempos do dia – se dá através de um mantra que desperta a consciência relacional do ser:

OṂ MITRADEVĀYA NAMAḤ • ṚTADHVANĪ SVĀHĀ
quando a disciplina deixa de ser obrigação e se torna aliança espiritual 

Neste selo de comunhão, Mitradevāya invoca o Amigo Celeste (Mitradeva) — princípio universal da amizade divina que dissolve o isolamento do eu — enquanto Ṛtadhvanī consagra o som interior do Ṛta, a vibração que alinha o jīva ao ritmo cósmico. A expressão final svāhā sela a entrega do mantra como oferenda silenciosa, fazendo da palavra um gesto de alinhamento e confiança.

Assim, a Dinacaryā não começa apenas com uma recitação, mas com uma abertura relacional em que o jīva se coloca em ressonância com o ritmo do cosmos e o sopro do Infinito.

Ao entoar (ou silenciar) este mantra ao amanhecer, selamos nossa respiração com o ritmo do Ṛta e iniciamos a jornada diária como quem caminha acompanhado pela vibração do Ser. A disciplina deixa então de ser obrigação e se torna aliança espiritual — e a respiração converte-se no veículo da consciência sagrada que pulsa em nós.

A Respiração como o Mantra do Sagrado Feminino do Universo:
OṂ haṃsas so'haṃ yogeśvarīṃ hrīṃ svāhā

Para selar o gesto interior da disciplina espiritual do Śraddhā Yoga (Heartfulness), revelado na  Bhagavad Gītā, basta o sussurro silencioso do Svatantra Mantra — OṂ haṃsas so'haṃ yogeśvarīṃ hrīṃ svāhā (OṂ eu sou o Eu Sou, saudações à Nossa Senhora do Yoga, Śrī Yoga Devī) —, cuja vibração nos reconecta à consciência da presença do Ser em nossa respiração (haṃsaḥ so'haṃ) e à confiança amorosa que ilumina o coração ao longo de todo o dia.

Despertando antes do nascer do sol, em meditação, nos preparamos para receber a luz do foco absoluto do coração. Esta luz é o laser da concentração que nasce com os olhos fechados e se manifesta em nosso olhar ao longo do dia, até o anoitecer, quando, suavemente, nossos olhos se fecham novamente.

A consciência fractal restabelecida em Ṛta ao amanhecer, focada na respiração e no foco absoluto do coração, irradia-se por todo o dia, nutrindo o que o Śraddhā Yoga chama de Śraddhā-vṛtti: o néctar da práxis sintrópica.

Śraddhā-vṛtti: o néctar da práxis sintrópica

Śraddhā-vṛtti é o movimento vivo da confiança luminosa no fluxo do dia. Nasce na escuta do coração (bhāvana nama!) e se desdobra em atitude ética, clareza afetiva e presença pacificada diante do real. Ela percorre, como fio invisível, os seis períodos do Ṣaḍ-kāla: desperta no Brahma-kāla, organiza-se no Śrī-kāla, é provada em Jyeṣṭhā-kāla, purificada em Pārvatī-kāla, integrada em Durgā-kāla e, finalmente, recolhida em Bhadra-kāla. Não é um estado estático, mas uma vibração amorosa que sustenta a práxis cotidiana como expressão de sintonia com a Grande Lei (Ṛta).

A experiência não é gerada internamente nem imposta externamente: emerge da comunhão entre a abertura sensível do jīva e a vibração do ākāśa em seu fluxo temporal (kāla). Quando o fluxo da atenção se ancora no foco absoluto do coração, a consciência entra em ressonância com esse campo sutil e a ação se torna expressão da sintropia — o chamado amoroso que unifica.

Assim, Śraddhā-vṛtti é o néctar da práxis sintrópica: a vibração da confiança que, acolhida ao amanhecer, sustenta todos os gestos, palavras e silêncios ao longo do dia, fazendo do viver um ato contínuo de reconexão com o Real.

Devemos, ao longo do dia, permanecer atentos ao chamado silencioso do universo, cultivando a escuta amorosa (bhāvana namaḥ) e permitindo que a confiança irradiada ao amanhecer se traduza em discernimento ético, ternura ativa e presença sintrópica diante de cada encontro. Nesse estado de vigilância suave, a vida inteira se converte em campo de revelação: cada gesto torna-se oferenda, cada palavra assume responsabilidade, cada silêncio acolhe um sentido ainda não manifesto. Assim, a jornada diária é conduzida como expansão da śraddhā-vṛtti — néctar que nutre a consciência e protege o coração contra a dispersão entrópica.

Em conformidade com o Ṣaṭkarman — os seis movimentos que estruturam a atividade diária do yogin —, cada momento do dia se torna oportunidade de reafinar a consciência. Enquanto o Ṣaṭkarman descreve os seis gestos fundamentais da disciplina, o Ṣaḍ-kāla oferece o mapa dos seis tempos em que esses gestos se enraízam: os deveres são o “como”, os períodos são o “quando” da mesma arte de sintonia. No recolhimento do amanhecer (prātaḥ-smaraṇa), a śraddhā-vṛtti é despertada; na prática meditativa (dhyāna), ela se densifica em foco; no estudo da ciência sagrada (adhyayana), torna-se compreensão iluminada; na ação quotidiana (karma), manifesta discernimento; no repouso intencional (viśrānti), se transforma em confiança; e, por fim, ao preparar-se para o recolhimento noturno, o praticante retorna ao eixo do coração, selando o ciclo. Assim, a disciplina diária não é um conjunto de tarefas devocionais, mas um modo de sincronizar vida, consciência e Ṛta na práxis sintrópica.

Desse modo, a Dinacaryā cumpre seu papel como rito de alinhamento inicial: desperta śraddhā, organiza o eixo interno entre hṛdaya e buddhi num estado de escuta amorosa (bhāvana) e reconduz o jīva ao fluxo de Ṛta através da práxis sintrópica. A respiração já não é simples função biológica, mas ponte sutil entre Brahma-Śakti e Ātman; o corpo já não é peso, mas solo consagrado; a mente já não é ruído, mas instrumento de escuta. É a partir desse estado de realinhamento que o praticante está pronto para ingressar na via do recolhimento e aprofundar a contemplação no silêncio do Ser — caminho que se desdobra na etapa seguinte: Dhyāna, a meditação como espelho puro da consciência.

Meditação (Dhyāna)

Dhyāna é o momento em que a mente, purificada por śraddhā e estabilizada no foco cardíaco, se curva ao ritmo de Ṛta e se deixa conduzir pelo alento como vibração do Ser. Não buscamos forçar a consciência a produzir silêncio, mas permitir que o silêncio original, já presente no Ājñā Chakra — ponto onde Iḍā e Piṅgala se reencontram — se torne audível. Nesse centro de convergência, o jīva percebe-se sustentado por um campo maior de presença, e a meditação deixa de ser esforço e se torna escuta amorosa.

A partir desse estado nascente de confiança luminosa, três mantras conduzem progressivamente o praticante ao eixo interior da consciência. Como passos de um mesmo retorno, eles alinham o coração à vibração da entrega (Saguṇa Dhyāna), revelam a identidade do Ser em nós (Nirguṇa Dhyāna), e abrem o espaço para a pura respiração do Real (Śuddha Dhyāna). Esse percurso não é doutrina, mas vivência: um itinerário sonoro no qual a vibração do mantra talha a mente segundo a forma do sagrado.

O primeiro chamado desse caminho é o Gītā Mantra, expressão de rendição consciente à presença cósmica que guia o guerreiro interior em direção ao seu próprio centro.

Com a mente recolhida no Ājñā Chakra, buscamos alinhar-nos ao ritmo de Ṛta — a ordem viva do cosmos — e reconhecer em nosso alento vital (prāṇa) a presença silenciosa de Īśvara, que ilumina cada gesto do dia com sentido. É nesse estado de escuta que a meditação se aprofunda por meio de três mantras essenciais da prática, iniciando com o Gītā Mantra “Om Namo Nārāyaṇāya”.



Quando pronunciamos “Om Namo Nārāyaṇāya”, colocamo-nos na mesma atitude interior de Arjuna no instante em que depõe a resistência e se abre ao olhar de Krishna. Este mantra é um gesto de rendição conscientemente assumida — não submissão cega, mas confiança luminosa (śraddhā) de que há uma sabedoria cósmica que habita e ultrapassa nossa individualidade.

No Ājñā Chakra — onde se unem Iḍā e Piṅgala — visualizamos a presença orientadora do Ser universal, e assim, o mantra se desdobra em três níveis de contemplação:
  • Saguṇa Dhyāna: saudamos as formas luminosas dos Avatāras, sábios, santos e santas de todas as tradições espirituais, como manifestações preservadoras da ordem cósmica (Ṛta).
  • Nirguṇa Dhyāna: reconhecemos o Ātman como presença silenciosa no coração — o Real sem forma que sustenta todas as formas.
  • Śuddha Dhyāna: entregamo-nos à realidade absoluta do Paramātman, para além de toda dualidade e identidade separada.
🕉️ Om Namo Nārāyaṇāya
Saudações ao Ser manifestado nas formas (Saguṇa),
ao Ser que habita o coração (Nirguṇa),
e ao Ser que transcende toda forma (Śuddha).

Na Bhagavad Gītā, essa dinâmica é representada pelo diálogo entre Arjuna e Krishna, expressão do par Nara–Nārāyaṇa: o ser humano em busca de sentido e o Ser cósmico que o sustém. Esse par ressoa com a imagem védica dos dois pássaros que habitam a mesma árvore: um que prova os frutos (jīva) e outro que apenas contempla (Ātman), ambos unificados no cisne Haṃsa — símbolo da consciência que discerne entre o efêmero e o eterno. Assim, o mantra “Om Namo Nārāyaṇāya” reconcilia exterior e interior, forma e essência, abrindo-nos à preservação da ordem cósmica (Ṛta) tradicionalmente associada a Vishnu como princípio sustentador do universo.

Esse mantra, presente como vibração implícita na Bhagavad Gītā e assumido em tradições devocionais como gesto de entrega consciente, guia-nos do conflito interior para a confiança na ordem cósmica, da dispersão para a escuta, da individualidade egóica para a consciência integrada. 

Ele prepara a mente para o passo seguinte: reconhecer que essa presença cósmica também pulsa em nossa própria respiração como identidade profunda do Ser. Assim, enquanto o Gītā Mantra nos coloca em atitude de rendição ao Todo em seus três níveis, o Svatantra Mantra revela que essa mesma realidade divina habita e se afirma na autonomia luminosa do jīva.


OṂ haṃsas so'haṃ yogeśvarīṃ hrīṃ svāhā
OṂ eu sou o Eu Sou, saudações à Nossa Senhora do Yoga, Śrī Yoga Devī

Se o Gītā Mantra nos conduz à rendição ao Todo, o Svatantra Mantra revela que esse mesmo Todo pulsa em nós como identidade. Ele é o mantra da liberdade ontológica: não da autonomia egocêntrica, mas da autoafirmação espiritual que nasce da comunhão com o Ser. Pronunciado no Ājñā Chakra — ponto onde Iḍā e Piṅgala convergem e a atenção se volta para o eixo interior — este mantra nos lembra que haṃsaḥ é o Ser universal que respira em todas as coisas, e so’haṃ é o reconhecimento de que essa respiração também me habita. Em hrīṃ vibra o ardor da invocação devocional, e em svāhā se sela a oferenda da palavra com gratidão.

Ao recitá-lo, concentramos a atenção no Ājñā Chakra — ponto de convergência entre Iḍā e Piṅgala — onde a dualidade se recolhe e a consciência se orienta ao eixo interior. Repetimos o mantra como afirmação silenciosa de nossa essência espiritual livre de condicionamentos. Haṃsaḥ evoca o Ser universal que respira através de todos os seres; so’haṃ é a percepção de que esse mesmo sopro habita a singularidade do jīva. Em Yogeśvarī reconhecemos Śrī Yoga Devī — a potência feminina da presença divina que conduz a consciência à integração. No som hrīṃ pulsa o ardor devocional, enquanto svāhā sela a palavra como oferenda: a identidade é entregue ao Fogo da Consciência, para que o eu se purifique na sua origem luminosa.

Concentrados no Ājñā Chakra, o ponto de encontro de Iḍā e Piṅgala, repitamos o Svatantra Mantra, o mantra da genuína liberdade, autonomia e autossuficiência da nossa essência espiritual. Ele rende graças (svāhā) à deidade Śraddhā, a Nossa Senhora do Yoga (Yogeśvarī), conhecida como Śrī Yoga Devī, de forma exclamativa, com um ardente viva (hrīm), como forma de reconhecimento e agradecimento pela revelação, em nossa própria respiração, da identidade do Ser (Haṃsa) e de nós mesmos (so'haṃ).

Do reconhecimento do Ser (haṃsaḥ) proclamado no Svatantra Mantra, passamos naturalmente à sua escuta contínua na respiração, onde cada inspiração e expiração se tornam espaço de presença. Assim, a afirmação identitária “haṃsaḥ so’haṃ” desdobra-se como experiência silenciosa no Dhyāna Mantra Haṃsa, preparando a mente para viver em estado de meditação vigilante ao longo do dia.


O Dhyāna Mantra Haṃsa é a passagem da afirmação à escuta: depois de reconhecer o Ser como haṃsaḥ e assumir essa identidade em so’haṃ, entramos no estado contemplativo em que a respiração se torna mantra vivo. No Ājñā Chakra — ponto de convergência entre Iḍā e Piṅgala — permitimos que cada inspiração ressoe como haṃ (o Ser que entra) e cada expiração como saḥ/so (o Ser que se expressa). Aqui, a meditação (dhyāna) deixa de ser ato pontual e se torna fluxo vital: respirar é recordar, e recordar é permanecer em sintonia com a presença do Ser. Esse mantra, repetido interiormente, sem esforço, é a forma pela qual a consciência permanece alinhada à pulsação sintrópica que une interior e exterior, eu e cosmos, silêncio e vibração.

Haṃ-so, haṃ-so, haṃ-so. . .

Sentados em silêncio, com os olhos suavemente fechados, deixamos que a respiração conduza o mantra e não o contrário. Inspiramos percebendo haṃ — o sopro do Ser que entra; expiramos sentindo so — o Ser que se manifesta e retorna ao todo. Não recitamos com a boca, mas permitimos que a vibração do alento revele a si mesma o ritmo do mantra. Nesse estado, o haṃso não é uma repetição mental forçada, mas um fluxo natural de presença: cada ciclo respiratório reafirma que o Ser universal (haṃsaḥ) vive em nós (so’haṃ), e que somos portadores de uma consciência que respira o cosmos.

Ao entrar nesse estado, repousamos a atenção no Ājñā Chakra — ponto de convergência de Iḍā e Piṅgala — e deixamos que o Haṃ-so se revele no ritmo natural da respiração. Inspiramos silenciosamente a presença do Ser (haṃ); expiramos a oferta amorosa de nós mesmos ao Todo (so). Não se trata de repetir uma fórmula, mas de escutar uma verdade que já pulsa em nós: quando inspiro, reconheço o Ātman como luz interior; quando expiro, descanso no Paramātman como vastidão amorosa.

Haṃ-so… haṃ-so… haṃ-so…

Neste ponto, a prática deixa de ser esforço e torna-se dhvani — ressonância. A ideia de ser individual se integra ao Ser na cadência serena da respiração. Haṃ-so não é afirmação nem súplica: é reconhecimento silencioso da unidade entre a vida que entra e a vida que se partilha. É o estado meditativo da convicção sintrópica e conexão viva com a verdade (śraddhā), que permanece velando no coração mesmo quando a mente se move entre as atividades do dia.

O Dhyāna Mantra Haṃsa nos traz a consciência de que o estado de meditação permanece latente em cada minúscula respiração. Despertamos a consciência de que esta prática permanece conosco o dia todo quando aprendemos a reservar alguns minutos do nosso dia a meditar, com os olhos suavemente fechados, em silêncio e em postura de prece, no alento vital que nos unifica ao cosmos.

*
***

OṂ OṂ OṂ

OṂ   TAT   SAT

Namastê! Namastê! Namastê!

Epílogo — O Ser que Vibra

A convergência de todas essas práticas — a disciplina diária (dinacaryā), a escuta afetiva do coração (śraddhā-vṛtti) e a meditação contínua centrada no foco absoluto (Heartfulness) — culmina na vibração unitiva selada pelo mantra de comunhão:

OṂ MITRADEVĀYA NAMAḤ • ṚTADHVANĪ SVĀHĀ.

Mitradevāya invoca o Amigo Celeste, princípio da amizade universal que une todos os seres; Ṛtadhvanī consagra o som de Ṛta, a ordem viva que sustenta o cosmos; svāhā oferece a palavra ao fogo do coração — como ato de entrega e esclarecimento interior.

Quando pronunciada em silêncio consciente, essa invocação reacende a chama da lucidez e alinha o praticante com a harmonia que pulsa no ritmo respiratório do universo.

Não se trata de culto exterior, mas de sintonia interior. A verdadeira liturgia acontece quando respiração, som e intenção ressoam em unidade. Invocar Ṛtadhvanī é permitir que o próprio alento se torne sopro de Brahman em nós. Ṛtadhvanī é o Haṃsa da frequência vital — o cisne que atravessa o silêncio como memória viva do Ser. 

No horizonte da Dinacaryā, o dia deixa de ser mera sucessão de compromissos e se revela como uma mandala de seis pétalas de tempo. Cada Brahma-kāla, cada Śrī-kāla, cada Jyeṣṭhā-, Pārvatī-, Durgā- e Bhadra-kāla é um modo diferente do Amor ordenar a existência. Quando o hṛdaya aprende a reconhecer essas tonalidades do Tempo, śraddhā se torna bússola e o próprio dia converte-se em liturgia: o Ṣaḍ-kāla pulsa como mantra silencioso, e o Ser que vibra é o mesmo que respira em OM.

Assim como o cosmos respira entre expansão e recolhimento, o yogin aprende a habitar esse intervalo sagrado onde kāla (tempo vivido), jīva (ser consciente) e ākāśa (espaço vibrante) se encontram na pulsação da unidade.

✨ No instante em que a inspiração e a expiração se recolhem no silêncio, permanece apenas o Amor que ordena — e o Ser vibra.

Toda palavra verdadeira nasce de uma escuta: śraddhā é a escuta amorosa do coração; dhvanī é a resposta do cosmos que ressoa nessa escuta. Entre ambas vibra a ponte da sintropia — a ordem que floresce do amor e se expande como ritmo vivo na respiração do ser.

Assim como o universo se expande e recolhe, o yogin respira entre inspiração e expiração; e, no instante suspenso em que tudo se cala, permanece apenas a frequência do Amor que ordena — e o Ser vibra.

🕉️ Anexo Contemplativo — Sugestão de Prática Guiada

Concentrados no Ājñā Chakra, o ponto de encontro de Iḍā e Piṅgala,
meditemos por alguns minutos, com os olhos suavemente fechados,
auscultando a nossa respiração e nos lembrando de que
a consciência deste mantra nos possibilita viver
a vida toda em estado de meditação . . . 

OṂ   OṂ   OṂ
Inspiro (haṃ-) paz e harmonia (Brahma-Śakti), expiro (so-) amor (Śraddhā)
Quando inspiro, sinto a presença do Ātman no meu coração;
quando expiro, sinto o meu coração no Paramātman. .  .
Haṃ-so-haṃ. . . 
OṂ eu sou o fogo ardente do coração
Haṃ-so-haṃ. . .
OṂ eu sou a presença da paz e do amor em ação
Haṃ-so-haṃ. . .
OṂ todo ressentimento transformo em compaixão e compreensão
Haṃ-so-haṃ-so-haṃ. . .
OṂ tudo é sagrado; tudo é de natureza sagrada; tudo é necessário.

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Rio de Janeiro, 12.06.22.
(Atualizado em 07.12.25)