2022-06-13

Aprendendo a Meditar no Coração

O que é a meditação? De forma breve, meditar é haurir śraddhā. E o que é śraddhā? Śraddhā é a expressão, tanto subjetiva como objetiva, da nossa capacidade de manifestar a amorosa luz do coração que nos orienta  para a unidade segundo o processo sintrópico quíntuplo, conhecido como Brahmasāmīpya. Como vimos anteriormente, cada um dos cinco estágios de Brahma-sāmīpya, descritos no Śuddha Yoga, decorre de śraddhā, o compassivo sentimento sintrópico, que define a Cultura Sintrópica e a sua práxis e se traduz como  verdadeira bússola do processo natural de meditação: (1) Saṃkalpa (decisão, resolução); (2) Ṛṣi-nyāsa (a expressão da Vontade Cósmica e Suprema, ou Brahma-śakti); (3) Viniyoga (a capacidade de reiniciar); (4) Satya Tyāga (a consagração de si mesmo à manifestação da Vontade Cósmica) e (5) Upasthāna (a gratidão e a lembrança constante do nosso ideal).

A meditação é simples e o verdadeiro praticante passa para os leigos e os iniciantes a impressão de que jamais medita. Isto porque ele se torna como Arjuna, que aprendeu de Krishna a fazer da sua vida toda uma meditação no coração. Discreto, leva uma vida ativa, em meditação e, raramente, se deixa flagrar em suas práticas mais íntimas e solitárias de meditação silenciosa.

Há uma conexão entre as três componentes essenciais das práticas de meditação sintrópica e três dos principais centros vitais do nosso corpo, localizados, respectivamente, na região entre as sobrancelhas, no centro do peito e no alto da cabeça. O primeiro centro abriga a sede da atividade racional e da capacidade de concentração com foco aberto ou fechado (dhāraṇā, ou mindfulness); o segundo, a sede do sentimento intuitivo individual e da amorosa capacidade compassiva de concentração unificada e contemplação (dhyāna); e o terceiro, a sede onde a consciência individual participa da Suprema Consciência Cósmica e experimenta o êxtase (samādhi) resultante da contemplação sintrópica da realidade única e transcendente.

Estabelecemos e afinamos a sintonia da razão com o coração espiritual por meio das práticas sintrópicas do bhāvana (sentimento amoroso da unidade) e do śuddha prāṇāyāma (respiração sintrópica), o mantra natural do processo de respiração. É a esta amorosa e compassiva sintonia fina, que identifica e unifica os focos aberto e fechado da nossa atenção, que se dá o nome de meditação. Implícita no discurso de Krishna na Bhagavad Gītā, ela se desenvolve em três níveis (externo, interno e transcendente), em conformidade com a ativação dos seus três respectivos centros, culminando, como veremos a seguir, na meditação na ação, definida pelo conselho de Krishna à Arjuna para não se entregar à inação.

Aprendendo a Meditar no Coração: o Dhyāna Mantra “Haṃsa”


OṂ haṃsas so'haṃ yogeśvarīṃ hrīṃ svāhā
OṂ eu sou o Eu Sou, saudações a Śrī Yoga Devī

Sentados em uma posição confortável e totalmente relaxados, com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, procuramos contemplar o desabrochar do amor espiritual, ou seja, procuramos sentir como todas as coisas e todos os seres hão nascido de dentro do Espírito Universal e participam de uma mesma vida, que a tudo compenetra e a tudo sustém, formando nos espaços infinitos um só corpo cósmico. Esta é, resumidamente, uma forma de expressar o sentimento de bhāvana.

Com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, respiremos suavemente, com amor, com alegria e com paz – tomando consciência do Dhyāna Mantra “Haṃsa”, auscultando esse mantra do processo natural da meditação, que se apresenta sob a forma do śuddha prāṇāyāma “Haṃ-sa”, cuja repetição, sem pausa, muda o som final de "sa" para "so": haṃ-so-haṃ-so. . .

Respiremos como se as nossas narinas não tomassem parte nesse processo. Respiremos bem suavemente, como se a nova respiração se desse a partir da nossa garganta, não de nossas narinas. Com a respiração tranquila, suave, ouvindo a nossa inspiração e expiração, vamos afinando a nossa sintonia com a energia cósmica que anima o universo. Haṃ-so-haṃ-so. . .

Inspiramos paz e irradiamos amor. Enquanto seguimos inspirando paz e irradiando amor, vamos nos identificando com o fogo ardente do coração, expresso no mantra Haṃ-so-haṃ-so. . .

Haṃ-so-haṃ-so. . .
OṂ Eu sou o fogo ardente do coração;
OṂ Eu sou a presença da paz e do amor em ação;
OṂ Tudo é sagrado; tudo é de natureza sagrada; tudo é necessário.

Meditemos por alguns minutos, lembrando-nos de que esta prática permanece conosco o dia todo, em cada minúscula respiração. . . Haṃ-so-haṃ-so. . .

A meditação externa

​Sentados uma posição confortável, totalmente relaxados, com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, os olhos fechados, imaginamos estar ante a presença amorosa dos seres celestiais. Contemplamos a imagem amorosa do ser objeto de nossa devoção, sem nos preocuparmos em visualizá-lo. Apenas imaginamos que estamos ante esta divina presença, do mesmo modo que fazemos quando sentimos saudades de um ente querido, que está distante. Deste modo, com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, nos ocupamos, unicamente, de contemplar o ser objeto de nossa devoção. Meditemos por alguns minutos.

A meditação interna

Com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, respirando suavemente, com alegria, com paz e amor, imaginamos agora o nosso próprio Espírito, o Alento Vital, o Sopro Divino, o Filho de Deus, a Centelha Divina, do tamanho de um polegar, presente em nosso próprio coração. Imaginamos esta Luz Natural que nos conecta com as leis do universo, unificando-nos com a própria vida, expressão de amor. Amor que se irradia do Espírito, em nosso peito, que permeia todo o universo e nos conecta a todos os seres. Meditemos por alguns minutos.

A meditação transcendental

Ainda com o pensamento concentrado entre as sobrancelhas, respirando suavemente, com alegria, com paz e amor, contemplemos a energia sintrópica de amor universal que organiza o universo orgânico e inorgânico. Contemplemos a Brahma-śakti permeando-nos por inteiro, a partir do alto da nossa cabeça, e nos unificando à consciência suprema do universo, que é puro Amor. Meditemos por alguns minutos. 

***

Podemos permanecer em qualquer um destes três níveis de meditação imóvel e silenciosa o tempo que julgarmos conveniente. Encerrada esta prática realizamos a saudação final e nos dirigimos para as nossas atividades diárias.

OṂ haṃsas so'haṃ yogeśvarīṃ hrīṃ svāhā
OṂ eu sou o Eu Sou, saudações a Śrī Yoga Devī

OṂ  OṂ   O

***

Meditação sintrópica: da meditação silenciosa à meditação na ação 

Durante a realização das nossas atividades diárias, devemos zelar para não perder a conexão estabelecida com o coração, lembrando-nos, o tempo todo, ao longo do dia, de manter a consciência do Dhyāna Mantra “Haṃsa” e do processo da respiração sintrópica (śuddha prāṇāyāma), que unifica a nossa mente ao nosso coração e, consequentemente, ao Espírito de todas as coisas (bhāvana). Assim, a meditação sintrópica começa a acontecer o dia todo, pois o nosso esforço em todas as atividades do cotidiano converte-se em uma forma de meditação, a meditação na ação.

OṂ TAT SAT
NAMASTÊ

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F I M

SUMÁRIO GERAL: A Arte e a Ciência da Meditação segundo a Bhagavad Gītā

Rio de Janeiro, 12.06.22.
(Atualizado em 01.09.23)

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