2018-11-27

Movimentos de Convergência: (1) Maciel por ele mesmo

Maciel e  seus paisO seguinte aforismo de Johann Goethe, "Trate as pessoas como se elas fossem o que poderiam ser e você as ajudará a se tornarem aquilo que são capazes de ser", resume a essência tropicalista da filosofia do coração que pude identificar em Luiz Carlos Maciel (1938 - 2017) a partir de nossos diálogos sobre a sua filosofia política e de vida e que pretendo introduzir nesta serie de artigos deste capítulo.

Tive a oportunidade de discutir com Maciel sobre as contradições de sua formação intelectual, muito influenciada pelos pais, que tinham visões de mundo bem diferentes: sua mãe era Católica Apostólica Romana; e o seu pai, ateu, materialista e simpatizante do Partido Comunista. Daí, inclusive, a razão da escolha do nome “Luiz Carlos”, em homenagem a Luiz Carlos Prestes (1898 – 1990). Foi por influência de sua mãe que Maciel estudou com os jesuítas no Colégio Anchieta, de Porto Alegre, recebendo educação religiosa. No Colégio, Maciel era muito instigado pelos padres para a importância de seguir a verdadeira fé, a religião católica. Ali aprendeu a filosofia tomista que fundamenta a Escolástica Medieval mas, tão logo se tornou adolescente, recebeu de presente do seu pai um exemplar do Manifesto Comunista de Marx e Engels. Isto levou Maciel a ler outras obras destes autores, o que fez com que ele fosse se colocando do lado do povo e se tornando, aos poucos, comunista à sua maneira. Foi de um polo ao outro muito rapidamente: da preocupação com a salvação individual após a morte, passou a experimentar o sentimento de injustiça social e o sofrimento da espécie humana, sujeito ao poder do capital, tal como denunciado pelos marxistas.
Foi por essa época que se deu o suicídio de Getúlio Vargas (1882 – 1954), quando o Terceiro Exército saiu às ruas de Porto Alegre para reprimir as manifestações que passaram a ocorrer imediatamente após o anúncio de sua morte. Estas manifestações, presenciadas por Maciel, o marcaram profundamente. Maciel tornara-se um marxista independente. No entanto, a preocupação com a sociedade e as classes menos favorecidas nunca o fez perder a preocupação com a sua alma. Percebia em si mesmo uma duplicidade de sentimentos, mostrando-lhe que a condição humana ia muito além das injustiças sociais. E foi assim que Maciel acabou descobrindo o Existencialismo, a filosofia da moda do pós-guerra. O Existencialismo tinha o sentido de alertá-lo para as suas limitações. Se ele não era capaz de salvar sequer a sua vida, como salvar a vida das vítimas de injustiça social? Desse conflito interior nasceu o interesse por dois livros, que podem ser considerados o início da sua trajetória intelectual.
O primeiro livro, do espanhol Miguel de Unamuno, chama-se Do Sentimento Trágico da Vida. O livro tem como tese central a afirmação do desejo de todo ser humano de ser imortal. Abominamos a morte. Queremos continuar sendo o que somos, aqui e agora. Queremos a imortalidade pessoal. Como isto é impossível, o sentimento trágico da vida é inevitável. Esta conclusão marcou profundamente o espírito de Maciel, que passou a se sentir como um condenado à morte.
O segundo livro que marcou o início de sua trajetória intelectual foi O Mito de Sísifo, de Albert CamusO Mito de Sísifo trata do absurdo da condição humana. Este mito grego descreve a punição que Sísifo recebe dos deuses: Sísifo é condenado a empurrar uma pedra pesadíssima até o alto da montanha. Quando a pedra chega ao topo, ela rola montanha abaixo e Sísifo tem que descer a montanha, pegar a pedra e empurrá-la uma vez mais montanha acima. E isto eternamente! Esta é a imagem que Albert Camus expõe em seu livro como a imagem da condição humana. A única pausa no esforço de Sísifo é quando ele desce a montanha. Camus sustenta que é preciso considerar Sísifo feliz.
O impacto destas duas obras é tão grande em Maciel que o leva a cursar Filosofia, quando os seus pais esperavam que ele estudasse Medicina, Direito, ou Engenharia. No curso de filosofia teve a sorte de encontrar o professor Gerd Bornheim (1929 – 2002) que o introduziu a outros filósofos existencialistas, dentre eles, Jean-Paul Sartre (1905 – 1980) e Martin Heidegger (1889 -1976), como mostra em seu último e derradeiro curso, gravado aqui em casa e estruturado em doze vídeo-aulas, divididas em cinco módulos mais um vídeo bônus:
  • Módulo 1 - Contexto do Anticurso Filosofia e Contracultura (vídeos 1 e 2)
  • Módulo 2 - De Marx a Heidegger: Uma Meditação sobre o Ser e o Nada (3 a 5)
  • Módulo 3 - O Surgimento da Contracultura como um Movimento de Síntese Poética (6 e 7)
  • Módulo 4 - O Poder da Flor: A Contracultura como um Experimento sobre os Estados de Consciência (8 a 10)
  • Módulo 5 - A Contracultura como um Caminho para as Verdades do Espírito (11 e 12)
  • Bônus - A Influência de Sartre no pensamento de Maciel
Conforme já disse anteriormente, o curso está disponível na plataforma online Hotmart (ver aqui) e, de algum modo, espelha e valida as discussões deste capítulo sobre a filosofia do coração de Luiz Carlos Maciel, conforme teremos oportunidade de mostrar nos textos seguintes.

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