2018-06-12

Constelação: onde quer que você esteja, seja a alma do lugar . . .

Aonde quer que você esteja, seja a alma do lugar
"Onde quer que você esteja, seja a alma do lugar" – esta frase, atribuída ao poeta Jallaludin Rumi (1207 - 1273) e utilizada no poema "O Silêncio" (veja aqui), de autoria de Chico Xavier, fez-me lembrar de uma experiência espiritual que tive em sonho em meados de maio de 2003, quando testemunhei os momentos que antecederam a minha própria concepção. Era como se estivesse me vendo antes de nascer, quando, sem a experiência densa da matéria deste mundo, o amor e a alegria se me apresentavam muito intensos. Nascer era ter em mim os meus pais, que tinham dentro deles outros pais, e assim sucessivamente. Uma vez descendo à  carne, todavia, percebia como era mais difícil discernir o bem e sentir amor, ou mesmo me recordar das promessas que fazemos antes de nascer [LE, Q. 132 e 330-343]1. Durante o sonho, parecia ter compreendido que todos os pais são representantes de Deus e experimentam, enquanto pais, um pouco da função divina de zelar e auxiliar no processo da criação. Eu testemunhara as dores e paixões vividas nos momentos que antecedem as concepções e via como os pais tinham nos filhos uma oportunidade de participarem do plano sagrado. Visualizara, inclusive, as suas lutas para a sobrevivência, inicialmente, longe do apoio e aconchego de toda uma estrutura familiar. Era a vida triturando os primeiros sonhos, conduzindo às primeiras quedas, até se iniciar, finalmente, a compreensão de todo este processo que nos faz perceber que, nos filhos, sempre mora um pedacinho dos pais. É por esta porta sempre aberta da família que o olhar dá uma festa na hora em que se retorna [A “Parábola do Filho Perdido”, Lucas, XV, 11-32].

Participara do momento em que a paixão entre meus pais instalou-se atraindo-me até eles. Assistira ao meu próprio nascimento e ainda ecoava em mim a canção de acalanto que me fazia ninar. Entendera porque precisara da solidão de um país distante como o Canadá para experimentar e compreender esta disposição amorosa que define os núcleos familiares. As famílias tinham, cada uma, a sua beleza, responsável por resgatar a nós mesmos do nosso passado. O nascimento era somente uma nova possibilidade de reencontro com a nossa própria ancestralidade divina, conforme descreve a literatura sagrada da Índia. O Ṛgveda (8.32.16; 6.61.1) menciona três débitos (Ṛṇa trayi) que todos temos o dever de pagar durante o decorrer de nossas vidas. Estes débitos, que todo ser humano herda ao nascer, aparecem melhor detalhados no Yajurveda (Taittiriya Samhita:VI.3. 10. 5), descritos como:
  1. Deva ṛṇa2, o débito com a esfera das deidades das quais herdamos a nossa própria identidade espiritual;
  2. Ṛṣi ṛṇa, o débito com os sacerdotes, gurus, sábios e santos que nos deixaram como herança cultural o conhecimento espiritual; e
  3. Pitru ṛṇa,o débito com os nossos ancestrais, que possibilitaram o nosso nascimento neste mundo. 

Aonde quer que você esteja, seja a alma deste lugar...
Tais obrigações encontram a sua justificativa na lei do karma3, o principal tema de dois dos principais poemas de Chico Xavier (1910 - 2002), "Destino e "O Silêncio", reproduzidos abaixo. E era disto que tratava também o seu livro Nos Domínios da Mediunidade, que estava lendo em atendimento ao convite do amigo que me visitava (ver A Presença dos Ancestrais). O livro tratava das constelações familiares e destas impressões que trazemos e nos dão identidade. Produtos da herança genética, as impressões digitais são únicas e representam o passado que nos faz conforme somos.  Deste modo, a identidade da alma seria, em suma, perceptível [LE, Q. 134-146] por meio do sentimento de simpatia [LE, Q. 291-303] ou antipatia que uns despertam nos outros, sem que se saiba ao certo a razão disto, mas pondo em movimento o nosso aprendizado dentro deste ciclo evolutivo.

Destino

Nascestes no lar que precisavas.
Vestistes o corpo físico que merecias.
Moras onde melhor Deus te proporcionou, de acordo com teu adiantamento.
Possuis os recursos financeiros coerentes com as tuas necessidades, nem mais, nem menos, mas o justo para as tuas lutas terrenas.
Teu ambiente de trabalho é o que elegeste espontaneamente para a tua realização.
Teus parentes, amigos são as almas que atraístes, com tua própria afinidade.
Portanto, teu destino está constantemente sobre teu controle.
Tu escolhes, recolhes, eleges, atrais, buscas, expulsas, modificas tudo aquilo que te rodeia a existência.
Teus pensamentos e vontades são a chave de teus atos e atitudes...
São as fontes de atração e repulsão na tua jornada e vivência.
Não reclames nem te faças de vítima.
Antes de tudo, analisa e observa.
A mudança está em tuas mãos.
Reprograme tua meta, busque o bem e viverás melhor!

O Silêncio

Onde quer que você esteja, seja a alma deste lugar…
Discutir não alimenta.
Reclamar não resolve.
Revolta não auxilia.
Desespero não ilumina.
Tristeza não leva a nada.
Lágrima não substitui suor.
Irritação intoxica.
Deserção agrava.
Calúnia responde sempre com o pior.
Para todos os males, só existe um medicamento de eficiência comprovada.
Continuar na paz, compreendendo, ajudando, aguardando o concurso sábio do Tempo, na certeza de que o que não for bom para os outros não será bom para nós…
Pessoas feridas ferem pessoas.
Pessoas curadas curam pessoas.
Pessoas amadas amam pessoas.
Pessoas transformadas transformam pessoas.
Pessoas chatas chateiam pessoas.
Pessoas amarguradas amarguram pessoas.
Pessoas santificadas santificam pessoas.
Quem eu sou interfere diretamente naqueles que estão ao meu redor.
Acorde…
Se cubra de Gratidão, se encha de Amor e recomece…
O que for benção pra sua vida, Deus te entregará, e o que não for, ele te livrará!
Um dia bonito nem sempre é um dia de sol…
Mas com certeza é um dia de Paz.

N O T A S

(1) A convenção para a referência às obras da Codificação Espírita foi apresentada no texto A Presença dos Ancestrais.
(2) Para conhecer a pronúncia das palavras sânscritas veja o nosso resumo do Guia de Transliteração e Pronúncia das palavras sânscritas.
(3) O primeiro débito é quitado por meio do serviço desinteressado a toda humanidade e do atendimento e respeito às Escrituras Sagradas; o segundo, por meio da reverência aos grandes santos, tornando-nos exemplos vivos das suas doutrinas e, o terceiro, prestando tributos aos nossos ancestrais (ritos funerários e homenagens), mostrando consideração pelos nossos familiares e respeito pelos seus valores morais e éticos. Daí o sentido e significado destas três "dívidas".


SUMÁRIO GERAL: A Arte e a Ciência da Meditação segundo a Bhagavad Gītā

Rio de Janeiro, 12 de junho de 2018.
(Atualizado em 22.03.20)

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