Neste artigo de abertura do presente capítulo apresento um pouco da história e dos fundamentos teóricos e práticos da cultura sintrópica, que norteou a criação e o desenvolvimento da (anti) disciplina A Arte e a Ciência da Meditação segundo a Bhagavad Gītā. Meditar significa desenvolver o amoroso sentimento sintrópico (śraddhā) de identidade com o triuno praṇava OṂ (AUM), conforme expresso pelos principais aforismos (mahāvākyas) da literatura védica, em especial, os seguintes, que constam da Chāndogya Upaniṣad: “sarvaṃ khalv-idaṃ brahma” – "Tudo isto é o Ser" (ChU 3.14.1) e “Tat tvam asi ” – “Tu próprio és o Ser" (ChU 6.8.7). A palavra "praṇava" é um nome para o som AUM. Significa, etimologicamente, “aquilo que renova, faz novo”. Também significa “controlador e dispensador do alento vital (prāṇa)”. Segundo outra etimologia (Yoga Sūtra I.29), o termo “praṇava” deriva de “pra” (antes, adiante) e “nava” (som, grito primal de exaltação) e designa o som primordial que reverbera dentro do sagrado recôndito do nosso coração e dos canais nervosos do nosso corpo. O Praṇava corresponde à respiração da criação cósmica e representa a voz (va) do prāṇa. O som onomatopéico OṂ é cheio de significado. Representa o ruído de fundo do universo em expansão, o som primordial da natureza e o seu próprio alento vital. AUM expressa esta verdade sagrada, tendo cada uma de suas letras um significado oriundo do método conhecido como akṣaramudrā, ou diagrama de selo de letras. Ambos aforismos exprimem o significado das metáforas e mantras que compõem a espinha dorsal, tanto deste livro-blog, como da nossa disciplina sobre a arte e a ciência da meditação: (1) a metáfora dos dois pássaros; (2) a metáfora do cisne; (3) a metáfora da quadriga; (4) o mantra AUM (OM); (5) o mantra Haṃsa; e (6) o mantra OM NAMO NĀRĀYAṆĀYA.
Uma reflexão canônica sobre a Arte e a Ciência da Meditação, inspirada na śraddhā da Bhagavad Gītā. Longe de ser mera fé, śraddhā é a confluência entre a fides e o cogito cartesiano, a experiência do fervor íntimo, da convicção profunda, e do poder de traduzir o amor em insight e ação, capaz de nos causar um arrepio profundo. Essa bússola interior, guiada pela confiança e prudência, ilumina a razão em direção à Verdade e ao Absoluto (Brahma-sāmīpya). Explore o SUMÁRIO abaixo.
2019-12-31
2019-12-28
041. Cozinhando com o Coração
Neste finalzinho de 2019 voltamos a divulgar nossas receitas vegetarianas e veganas. Ainda temos muitas dicas importantes para quem busca uma refeição balanceada, saudável, natural e fácil de fazer. O preparo do próprio alimento é um ato de amor e liberdade.
RECEITAS DA SEMANA: Arroz basmati com uvas passas e amêndoas tostadas; Torta de tofu com alho poró; Salada de acelga chinesa; Cookies de banana e aveia; Suco de manga com banana.
1. Arroz basmati com uvas passas e amêndoas tostadas (vegano)
Rendimento: 8 porções
Ingredientes:
2 xícaras (chá) de arroz basmati
1 cebola tamanho médio
2 dentes de alho
½ xícara (chá) de lascas de amêndoas
½ xícara (chá) de uvas passas (preta ou branca) sem sementes
4 xícaras (chá) de água fervendo
½ xícara (chá) de azeite
½ colher (sopa) de creme vegetal (ou manteiga para os não veganos)
sal
2019-12-22
A Perfeita Alegria do Satsañga do Dia de Ação de Graças
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Fazenda Mãe Natureza (Povoado da Saúde, Santana de São Francisco - SE) |
Conta-se que depois de ouvir o depoimento de uma moça cega, que teria dito dar tudo para enxergar uma noite de luar, Ludwig Van Beethoven teria recuperado a vontade de viver e composto “Sonata ao luar”. Beethoven encontrava-se em profunda depressão. Chegara a redigir um documento dizendo que iria se suicidar. O depoimento da jovem, contudo, o emocionara a ponto de o fazer reconhecer o quanto deveria ser grato por poder expressar em sua arte tudo o que via. Olhando para o céu prateado de luar e lembrando da morte de um ente querido que o mantinha em luto, ele se deixa mergulhar num estado de profunda meditação, que lhe desperta na alma o desejo de traduzir em notas musicais aquela impressão divina de beleza e arte de uma noite de luar. E a melodia de “Sonata ao luar” surge imitando os passos vagarosos daqueles que seguem o cortejo fúnebre que encerra o velório. A sua melodia podia retratar, para aqueles que não podem ver com os olhos físicos, a beleza de uma noite banhada pela claridade da lua. Alguns anos depois, já totalmente surdo, Beethoven comporia, como parte da Nona Sinfonia, o Hino à Alegria, onde pode expressar a sua gratidão à vida e por não ter se suicidado.
Quem nunca se sentiu, em algum momento da vida, extremamente só e com vontade de desistir? Até que alcancemos o estado de Perfeita Alegria, que nos permite compreender que nenhum filho de Deus fica esquecido e sem o auxílio espiritual para transcender o sofrimento e alcançar a participação na vida divina, ficamos todos sujeitos ao desânimo. Mas então, o que é e como se alcança a Perfeita Alegria?
2019-07-30
As Práticas de Meditação e a Cultura Sintrópica
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Quadro simbólico do desenvolvimento da tese Śraddhā in the Bhagavad Gītā" (2007). |
O objetivo principal das práticas de meditação é nos nutrir de śraddhā, o amoroso sentimento sintrópico que, como uma bússola interior, ilumina a razão em direção à Verdade e ao Absoluto (Brahma-sāmīpya). É esse sentimento que nos conduz do saṁsāra (realidade aparente) ao nirvāṇa (realidade sagrada), na medida em que aprofundamos a compreensão de Ṛta – a lei universal que rege os processos entrópicos da matéria inorgânica e os processos sintrópicos do mundo espiritual e orgânico.
As práticas de meditação se intensificaram no Ocidente a partir dos anos sessenta, impulsionadas pela contracultura – movimento que questionava a cultura dominante em seus diversos aspectos, da política à religião. Buscando a harmonia com a natureza e suas leis sagradas, os jovens da época buscaram na meditação um caminho de conexão com o fluxo sintrópico da vida, em contraste com as ideologias vigentes, oriundas de filósofos e valores superados do século XIX. Inspirados pelo lema revolucionário de "Paz e Amor", deram origem a diversas comunidades hippies, adeptas das práticas de meditação. Era o Poder da Flor contra o poder das armas. Apesar de a utopia hippie não ter se concretizado, seus valores, como a busca pela paz interior e a harmonia com a natureza, gradualmente influenciaram a cultura ocidental, incluindo o Brasil1. Assim, as práticas de meditação conquistaram espaço em universidades e sistemas de saúde, reconhecidas por seu potencial de harmonização individual e social."
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2019-04-06
A Bhagavad Gītā como Metáfora da Arte e da Ciência da Meditação
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Sanjaya narra o diálogo da Bhagavad Gītā para o rei cego Dhritarashtra. |
A Bhagavad Gītā constitui-se como um resgate da história da arte e da ciência da meditação, sob a forma de uma reportagem ao rei cego Dhritarashtra, em tempo real, do diálogo entre os príncipes Krishna e Arjuna, instantes antes do início da grande batalha final do Mahābhārata. Representa um pequeno diálogo de coração-a-coração (saṃvāda), de 700 versos, dentro da narrativa maior do épico (aproximadamente 100.000 versos), onde o protagonista Arjuna1 escuta de Krishna como desenvolver a śraddhā2 necessária para sair do seu “estado de ilusão e confusão mental” em relação ao dharma (sagrado) e para dar sequência ao processo de individuação do Ser e, consequentemente, de comunhão com o sagrado.
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2019-03-24
040. Cozinhando com o Coração
RECEITAS DA SEMANA: Lentilha com tofu defumado; Purê de inhame e beterraba com alho poró; Salada de pepino com molho de iogurte; Bolinho de banana sem farinha; e Limonada com açafrão.
1. Lentilha com tofu defumado (vegana)
Rendimento: 4 porções
2019-02-18
039. Cozinhando com o Coração

1. Bifum com legumes (vegano)
O bifum é um macarrão oriental feito de arroz e não contém glúten. É leve, saboroso e ajuda a perder peso. É muito fácil de preparar e com legumes fica muito nutritivo.
Rendimento: 5 porções
2019-02-06
O "Bom-Senso", a Bhagavad Gītā e o contexto do Mahābhārata
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Eu penso, portanto eu sou. (Discurso sobre o Método, 1637) |
O bom-senso (com hífen), representa, diferentemente do senso comum (sem hífen), a base fundamental onde se assentam todas as expressões verdadeiras, justas e belas. Pode ser entendido como o resultado do pleno funcionamento da razão, quando iluminada pelo sentimento ajuizado que jorra do coração. Neste sentido novo, o antônimo de "bom-senso" é "fé cega" e não "mau senso". O bom-senso, portanto, previne contra toda a espécie de dogmatismo, fantasia, idolatria e fanatismo. Esta definição ingênua, quase óbvia, poderia ter sido formulada por Descartes, mas ele não explicou completamente o que entendia por "bom senso" (sem hífen). O resultado é que até hoje os lexólogos só reconhecem o sentido da expressão sem o hífen. O bom-senso (com hífen) de Descartes, contudo, manifesta-se em sua obra como a expressão elevada desse sentimento ardoroso interior que o orientou, de forma indubitável, como uma bússola, em direção à sua primeira certeza sensível: "cogito ergo sum" – penso, logo existo (1644). A certeza sensível é uma expressão da harmonia entre a razão (mente) e o coração (intuição). Surge do mesmo bom-senso que fez Descartes ferver por inteiro, impedindo-o de sucumbir à letra morta das Escrituras, à autoridade papal e, principalmente, de cair vítima da interpretação cega das leis e dos costumes da época. Foi o seu bom-senso que impediu a sua razão de se tornar mera desrazão, à serviço de interesses obscuros das pseudo-ciências, pseudo-religiões e pseudo-justiça. O seu bom-senso, ou seja, a sua razão iluminada pela luz do coração, dotou-o de coragem para driblar a desrazão vigente e manter a coerência entre o seu discurso e a sua prática.
2019-01-26
Arjuna e o Poder da Renúncia e da Entrega
Este artigo discute a distinção entre os conceitos védicos designados pelos termos "saṃnyāsa" (renúncia) e "tyāga" (entrega), redefinidos por Krishna ao longo do episódio da Bhagavad Gītā. Krishna discute a natureza fractal e sintrópica da ação virtuosa, caridosa, amorosa e perfeitamente ética, que se vincula ao mistério da renúncia ao efêmero e entrega ao sagrado. Ele trata, em suma, da renúncia (saṃnyāsa1), como a condição sine qua non do despertar da consciência, e da entrega (tyāga), como a condição necessária para a ascese mística (Brahma-sāmīpya).
2019-01-21
Movimentos de Convergência: (8) Carlos Castaneda e Philip K. Dick

Alan Watts afirma que, para o ocidental, a verdade necessita ser formulada pelo pensamento e expressa pela linguagem, enquanto no oriente ela tem uma via completamente diferente: a verdade necessita ser experimentada. Não faz sentido para o oriental afirmar, “a verdade objetiva é que”. Seria o equivalente a se dizer: “a saúde objetiva é que”. Ora, a saúde é um estado do corpo, do mesmo modo que a verdade é um estado do espírito. Para Alan Watts, a verdade é para ser experimentada e não formulada pelo discurso, como pretendia o projeto de Heidegger.
2019-01-16
Movimentos de Convergência: (7 ) O Flower Power (Poder da Flor) como um movimento pacifista de vanguarda


Contracultura: de onde surgiu esta palavra? Segundo Luiz Carlos Maciel, este termo expressa uma invenção da mídia americana para designar os fenômenos culturais de vanguarda dos anos sessenta (veja aqui). A contracultura nunca se viu como contracultura, mas a mídia ansiava por um termo que sugerisse que aquelas manifestações culturais eram inimigas da cultura. Os artistas e as demais pessoas envolvidas na contracultura não se abalaram com isso e simplesmente adotaram o termo. A contracultura manifestou-se nos EUA como uma cultura que avançava para o futuro nos planos da política, do comportamento, da moral, da expressão artística, da filosofia e da religião. Inicia-se no plano da política pacifista de inspiração inglesa, com o movimento a favor do desarmamento nuclear e as grandes manifestações de Trafalgar Square, que contaram com a presença de Bertrand Russell.
2019-01-14
Movimentos de Convergência: (6) a contracultura e os estados alterados de consciência

2019-01-10
Espiritualidade e Tolerância Religiosa

2019-01-08
Movimentos de Convergência: (5) Norman O. Brown e a abertura para o mistério

2019-01-07
A Bhagavad Gītā e a Bhāṣyopetā de Haṃsa Yogi
Pretendo discutir neste artigo duas questões relacionadas com a tese "Śraddhā in the Bhagavad Gītā" (2007). A primeira refere-se às razões para não ter considerado diretamente no corpo da tese o texto da Bhagavad Gītā editado pela Śuddha Dharma Maṇḍalam1. A segunda questiona a relevância das discussões geradas em torno desta nova recensão da Bhagavad Gītā. Em linhas gerais, pode-se afirmar que a polêmica gerada por esta nova versão da Bhagavad Gītā constitui um "pseudo-problema", ocasionado pela publicação desse extrato do seu "comentário-guia" da Bhagavad Gītā, intitulado Śrī Bhagavadgītā Bhāṣyopetā, que apresenta, para efeitos de sua análise (Śuddha Sāṃkhya) e síntese (Śuddha Yoga), uma ordem de versos e capítulos distinta da usual.
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2019-01-05
Movimentos de Convergência: (4) a metafísica da contracultura

2019-01-02
038. Cozinhando com o Coração
RECEITAS DA SEMANA: Espaguete com alcaparra e tomate cereja; Brócolis ao pesto; Bagel; Banana assada; Suchá de hibisco, morango e hortelã.
1. Espaguete com alcaparra e tomate cereja (vegano)
Rendimento: 5 porções
Ingredientes:
500 g de espaguete, prefencialmente de massa fresca ou de semolina
2 cebolas, de preferência roxas, bem picadas
3 dentes de alho bem picados
250 g de tomate-cereja
suco de 1 limão siciliano
2 colheres (sopa) de alcaparra em conserva, escorrida, lavada e picada
6 colheres (sopa) de azeite
pimenta-do-reino moída na hora
sal a gosto
salsinha fresca para decorar
2019-01-01
Movimentos de Convergência: (3) Heidegger

Luiz Carlos Maciel estudou filosofia, segundo ele próprio afirma (veja aqui), pelo livro Introducción a la Filosofía, de Manuel García Morente. O texto apresenta um panorama bastante acessível da filosofia ocidental. Morente parte da dualidade fundamental de sujeito e objeto, e sustenta que no início da história da filosofia a ênfase era no objeto, ou seja, na realidade – aquilo que está fora de mim, tudo que não sou eu.
Segundo Morente, a primeira grande revolução filosófica acontece com a filosofia moderna (Descartes, Leibniz, Spinoza), que desloca a ênfase do objeto para o sujeito. Daí decorre a famosa frase de Descartes “Penso, logo existo” (Cogito, ergo sum). Descartes coloca o pensamento subjetivo antes da existência, que é objetiva. É o pensamento subjetivo que o autoriza a acreditar no objeto. Nasce daí a relação estabelecida aqui entre a certeza sensível, expressa no cogito cartesiano, e o conceito de śraddhā na Bhagavad Gītā. Esta tendência de valorização do sujeito ocorre também no empirismo inglês, o qual questiona, inclusive, a própria substancialidade do objeto. Em outras palavras, é a reunião das experiências sensoriais (pelo tato, olfato, paladar, audição e visão) que dão existência aos objetos fora de nós. Do mesmo modo, a filosofia do idealismo alemão (Kant, Fichte, Schelling e Hegel.) coloca o objeto como resultado de uma experiência, ou seja, de um testemunho do sujeito. Esta tendência aprofunda-se com Hegel e tem a sua culminância com Soren Kierkegaard, pensador dinamarquês que se atreveu a criticá-lo. Para marcar a importância e o sentido filosófico da vida Kierkegaard afirmou que Hegel seria como um homem muito rico que, ao construir uma mansão maravilhosa, teria optado por morar do lado de fora, na casa do zelador. Para Kierkegaard, Hegel construíra um edifício teórico espantoso, mas inútil, pois despreza a única coisa que interessa – a vida, a existência. Nasce assim o movimento da Filosofia Existencialista, que marcou profundamente a vida de Maciel.
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